terça-feira, 4 de dezembro de 2012

LITURGIA EM MUTIRÃO III (05 - OS SACRAMENTOS SÃO SÍMBOLOS) - CNBB




FICHA 05 : OS SACRAMENTOS SÃO SÍMBOLOS?[1]

     

                                  


 Ione Buyst

Sacramentos: sinais sensíveis...

            Temos o costume de chamar de “sacramentos” os gestos principais que expressam e sustentam nossa fé cristã: batismo, confirmação, eucaristia, reconciliação, unção dos enfermos, ordenação, matrimônio. São sinais sensíveis que realizam aquilo que significam (Cf. SC 7). E o que significam? São chamados a significar, cada qual a seu modo, o mistério da nossa fé, o mistério pascal de Jesus, o Cristo. Pelo batismo, somos mergulhados na morte de Jesus, para ressuscitarmos com ele (Cf. Rm 6, 3-11). Também, ao realizarmos a ação eucarística, realiza-se em nós, sacramentalmente, em mistério, a morte-ressurreição de Jesus, a sua páscoa.
               
Uma nova teoria para explicar os sacramentos...

            Em cada época da história, os cristãos tentaram estudar e explicar, na medida do possível, estas ações sacramentais. Nenhuma explicação será jamais totalmente satisfatória, porque mistério tão grande não cabe em explicações; compreendemos apenas pela fé, instruída pelas Sagradas Escrituras; compreendemos pela experiência celebrativa e pela experiência do seguimento de Jesus no dia-a-dia de nossa vida. Mas, como somos seres racionais, devemos tentar explicar e entender racionalmente, até onde der...

            Atualmente, a maneira de explicar o que acontece quando celebramos um sacramento passa pela “teoria simbólica”. A realidade teológica (sacramento) é analisada do ponto de vista antropológico, enquanto símbolo. Por exemplo, o que acontece no batismo? Num sinal sensível (mergulhar e retirar das águas), aparece e começa a atuar uma realidade escondida, oculta a nossos sentidos. Qual é esta realidade? O mistério pascal de Jesus Cristo. Deixando-nos batizar, optamos por uma vida de seguimento de Jesus, que viveu uma vida de doação, de entrega, de compromisso total com o reino de Deus. E confiamos que, assim, o Pai nos dará a vida em plenitude, numa comunhão de vida, para sempre. Somos identificados com Cristo na sua morte-ressurreição. Sua páscoa acontece em nós.

A graça supõe e assume a natureza...

            O sinal sensível do batismo é um elemento da natureza (água), uma ação de nossa experiência cotidiana ou social com seu sentido evidente (mergulhar na água, correr o perigo de afogar-se numa enchente, ser retirado(a) das águas por outra pessoa, que às vezes até arrisca sua vida para nos salvar...). Este primeiro sentido recebe um complemento das Sagradas Escrituras, principalmente do Novo Testamento, onde este gesto se refere a Jesus e àqueles que se tornam seus seguidores: seu batismo no Jordão, seu batismo na morte, sua ressurreição, como salvamento por parte do Pai, e nossa participação em sua morte-ressurreição.

A força vital, a energia psíquica gerada pela simbolização é como que potencializada pelo Espírito Santo. O dinamismo do Espírito Santo se manifesta e trabalha no gesto humano simbólico. O Sopro Divino assume a água e a transforma, a transfigura, fazendo aparecer a vida divina na realidade humana. A realidade teologal se encarna e se manifesta e atua na realidade humana, antropológica, seguindo a lei da criação, a lei da encarnação e da epifania, a lei da ressurreição e da escatologia. A atuação do Espírito Santo passa pela ação simbólica; atinge-nos pela simbolização.

Seguindo a lei da criação...

            Afinal, Deus nos fez assim, como seres corpóreos/espirituais. Ou como diz o relato bíblico da criação, somos feitos(as) de “barro e brisa”: o Senhor modelou um boneco de barro, soprou sobre ele com sua divina brisa, seu divino sopro, e assim nasceu o ser humano, como ser vivente. Por isso, a comunicação com os seres humanos, mesmo a mais espiritual, passa necessariamente pelo “barro”, pelo corpo, pelos sentidos, pela “matéria”. E os sacramentos seguem esta lógica, esta teo-lógica da criação. Nos sacramentos se unem a “matéria” e o Espírito.

Seguindo a lei da encarnação e da epifania (manifestação)...

            São João, o evangelista, diz que em Jesus “o Verbo se fez carne”; a Palavra de Deus se fez gente com a gente; ergueu seu barraco no meio de nós. Deus se fez “barro”, “matéria”, corpo, possível de ser ouvido, visto, apalpado... por nós, seres humanos, para que pudéssemos entrar em comunhão com ele e encontrar assim nossa felicidade. Assim o expressa o mesmo São João no início de sua primeira carta: “O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com nossos olhos, o que contemplamos e o que nossas mãos apalparam o Verbo da vida - porque a Vida manifestou-se (...) - o que vimos e ouvimos vo-lo anunciamos, para que estejais em comunhão conosco. E a nossa comunhão é com o Pai e com seu Filho Jesus Cristo. E isto vos escrevemos para que a vossa alegria seja completa” (1Jo 1,1-4).

            Por isso, os sacramentos seguem esta lógica, esta teologia da encarnação e da manifestação de Deus em nossa humanidade: a realidade divina se manifesta a nossos sentidos, em coisas para ver, ouvir, sentir, cheirar, saborear..., e desta maneira entra em comunhão conosco.

Seguindo a lei da ressurreição e da escatologia...

            Pela ressurreição, o corpo torturado, mutilado, crucificado de Jesus transformou-se em um corpo espiritual, pneumático. Nele nos tornamos gente nova, não mais escravos da natureza humana, mas gente que se deixa guiar pelo Espírito de Deus que ressuscitou Jesus dos mortos. Com ele iniciam os novos céus e a nova terra, já presente em germe entre nós. E os sacramentos seguem esta lógica, esta teologia da ressurreição e de escatologia: nos sinais sacramentais já está espiritualmente presente a realidade futura, o reino dos céus, a vida que não termina com a morte.

Sacramento é mistério...

            É bom lembrar ainda que, a partir do Concílio Vaticano II, a palavra “sacramento” (que vem do latim) está sendo de novo entendida como “mistério” (palavra grega que, nos primeiros séculos do cristianismo, foi traduzida por “sacramento”).  Falamos da Igreja como mistério. “Mistérios” são também a eucaristia e o batismo..., porque neles transparece para nós e nos atinge o mistério de Deus, a vida de Deus; Deus enquanto realidade que sustenta e abrange tudo quanto existe. No sacramento vivido como ação simbólica, o mistério aparece e atua: tocando os sinais sensíveis, tocamos o mistério e somos transformados(as) por ele.

            Isto nos ajuda a não restringir o sacramento ao momento da celebração: a ação sacramental faz aparecer o sentido de toda a nossa vida, vivida em comunhão com Jesus Cristo, como experiência do mistério de Deus no mistério da vida humana. Ajuda-nos ainda a não entender o sacramento como um gesto quase mágico (batizou, salvou): é o mistério que atua em nós, é Deus, é o Espírito Santo do Cristo ressuscitado, que vai, ao longo de toda a nossa vida e com a nossa participação, nos transformando, nos revitalizando.

Os sacramentos são ações simbólico-sacramentais

            Para deixar claro esta realidade humano-divina, gosto de dizer que o batismo (assim como os outros sacramentos) é uma ação simbólico-sacramental. “Simbólica”, enquanto realidade humana: “sacramental”, enquanto realidade divina; “simbólico-sacramental”, enquanto realidade humano-divina, na qual o divino e o humano estão aliados, entrelaçados, inseparáveis. E espero que, assim, vocês tenham se recuperado do primeiro susto com a pergunta que está como título desde artigo! Sim, sacramentos são símbolos, ações simbólicas. Mas para entender isso, você deve superar o sentido muito limitado que às vezes se dá no linguajar cotidiano, quando se diz: “É apenas simbólico”, como se fosse uma coisa que não deva ser levada muito a sério ou que não seja real!


Perguntas para reflexão pessoal ou em grupos:

1.         Qual a compreensão que nós temos de sacramento?  E o povo que procura os sacramentos em nossa Igreja, o que pensam a respeito disso?
2.         Como entender as três leis da simbologia (criação, encarnação e ressurreição)? Ficou claro para nós esta explicação?
3.         Como entender a afirmação de que os “sacramentos são símbolos”?



[1]  Artigo publicado na Revista de Liturgia n. 159, maio/junho 2000, pág. 9 e 10 e no livro Celebrar com símbolos, Paulinas, 2001, pág. 49 a 54.


Fonte> http://www.cnbb.org.br/site/component/docman/cat_view/236-liturgia-em-mutirao-iii?start=20

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